Marguerite Yourcenar, pseudônimo de Marguerite Cleenewerck de Crayencour (anagrama de Yourcenar) (Bruxelas, 8 de Junho de 1903 — Mount Desert Island, 17 de Dezembro de 1987), foi uma escritora belga de língua francesa. Foi a primeira mulher eleita à Academia Francesa de Letras em 1980, após uma campanha e apoio activos de Jean d'Ormesson, que escreveu o discurso de sua admissão.
Foi educada de forma privada e de maneira excepcional: lia Jean Racine com oito anos de idade, e seu pai ensinou-lhe o latim aos oito anos e grego aos doze.
Em 1939 mudou-se para os Estados Unidos, onde passou o resto de sua vida, obtendo a cidadania estado-unidense em 1947 e ensinando literatura francesa até 1949.
As suas Mémoires d´Hadrien (Memórias de Adriano), de 1951, tornaram-na internacionalmente conhecida. Este sucesso seria confirmado com L'Œuvre au Noir (A Obra em Negro, 1968), uma biografia de um herói do século XVI, chamado Zénon, atraído pelo hermetismo e a ciência. Publicou ainda poemas, ensaios (Sous bénéfice d'inventaire, 1978) e memórias (Archives du Nord, 1977), manifestando uma atracção pela Grécia e pelo misticismo oriental patente em trabalhos como Mishima ou La vision du vide (1981) e Comme l´eau qui coule (1982).
ALEXIS ou o Tratado do Vão Combate – Marguerite Yourcenar
Alexis é uma carta. É um livro. É um livro-carta. De Alexis para Mônica. Escrito em 1927; publicado em 29. Alexis escreve porque não pode silenciar, ou porque já silenciou por muito tempo, ou porque não pode escrever silenciando ou silenciar escrevendo. Literatura é fala, é grito, literatura é berro. Assim começa. Alguém se desculpando pela estreiteza da palavra escrita, pela falta de meios, pela grosseria dos sentimentos quando alocados em frases limitadas, que deveriam significar muito mais do que comportam. É declarando a pobreza de suas ferramentas que Alexis constrói seu pedido de desculpas.
Alexis é infiel. E a sua história é sobre infidelidade. Ou melhor, infidelidades. Porque a traição é sempre plural, coletiva. A traição nunca é de uma pessoa apenas. As páginas se sucedem e as justificativas, causas, culpas, vão dando os contornos da obra. É na busca pelo perdão de Mônica que Alexis vai se encontrando e se montando. Pede perdão por não amá-la, pelo menos não no sentido que ela gostaria; por ter ficado ao seu lado mesmo sabendo que nunca iria amá-la; por ter desperdiçado o tempo dela e criado ilusões. E que percebia seu desespero, sua fisionomia abatida, como se ela se perguntasse o que havia de errado consigo, até fazê-la acreditar que era incapaz de semear a paixão em um homem. As palavras vão traçando caminhos por si sós, o leitor começa a se indagar de o porquê da impossibilidade desse amor se concretizar. A história desloca o foco. Pequenas passagens de fundo erótico da vida de Alexis começam a se insinuar, sempre relacionadas a outros garotos. Uma alma reprimida que luta contra os ideais de uma infância puritana.
Tudo é muito sutil, não se esqueçam da data do livro. Mas, justamente por não poder ser dito às claras, a expiação de culpa de Alexis é um exercício árduo e sinuoso de autoconhecimento: das lembranças do vestiário do colégio à fuga para o bosque na companhia de outro rapaz. É a penitência da infidelidade com a própria condição escrita em forma de carta para a mulher que abandonou.
Alexis ou o Tratado do Vão Combate é uma obra que não tem excessos; cada idéia, frase, é uma porta para reflexão. Só lembro de um livro com igual prumo: O Livro do Desassossego, de Fernando Pessoa.
A última passagem se tornou clássica. Permito-me transcrevê-la: “Peço-te humildemente, o mais humildemente possível, perdão, não por te deixar, mas por ter ficado por tanto tempo”.
Marguerite Yourcenar, pseudônimo de Marguerite Cleenewerck de Crayencour (anagrama de Yourcenar) (Bruxelas, 8 de Junho de 1903 — Mount Desert Island, 17 de Dezembro de 1987), foi uma escritora belga de língua francesa. Foi a primeira mulher eleita à Academia Francesa de Letras em 1980, após uma campanha e apoio activos de Jean d'Ormesson, que escreveu o discurso de sua admissão.
ResponderExcluirFoi educada de forma privada e de maneira excepcional: lia Jean Racine com oito anos de idade, e seu pai ensinou-lhe o latim aos oito anos e grego aos doze.
Em 1939 mudou-se para os Estados Unidos, onde passou o resto de sua vida, obtendo a cidadania estado-unidense em 1947 e ensinando literatura francesa até 1949.
As suas Mémoires d´Hadrien (Memórias de Adriano), de 1951, tornaram-na internacionalmente conhecida. Este sucesso seria confirmado com L'Œuvre au Noir (A Obra em Negro, 1968), uma biografia de um herói do século XVI, chamado Zénon, atraído pelo hermetismo e a ciência. Publicou ainda poemas, ensaios (Sous bénéfice d'inventaire, 1978) e memórias (Archives du Nord, 1977), manifestando uma atracção pela Grécia e pelo misticismo oriental patente em trabalhos como Mishima ou La vision du vide (1981) e Comme l´eau qui coule (1982).
Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Marguerite_Yourcenar
ALEXIS ou o Tratado do Vão Combate – Marguerite Yourcenar
ResponderExcluirAlexis é uma carta. É um livro. É um livro-carta. De Alexis para Mônica. Escrito em 1927; publicado em 29. Alexis escreve porque não pode silenciar, ou porque já silenciou por muito tempo, ou porque não pode escrever silenciando ou silenciar escrevendo. Literatura é fala, é grito, literatura é berro. Assim começa. Alguém se desculpando pela estreiteza da palavra escrita, pela falta de meios, pela grosseria dos sentimentos quando alocados em frases limitadas, que deveriam significar muito mais do que comportam. É declarando a pobreza de suas ferramentas que Alexis constrói seu pedido de desculpas.
Alexis é infiel. E a sua história é sobre infidelidade. Ou melhor, infidelidades. Porque a traição é sempre plural, coletiva. A traição nunca é de uma pessoa apenas. As páginas se sucedem e as justificativas, causas, culpas, vão dando os contornos da obra. É na busca pelo perdão de Mônica que Alexis vai se encontrando e se montando. Pede perdão por não amá-la, pelo menos não no sentido que ela gostaria; por ter ficado ao seu lado mesmo sabendo que nunca iria amá-la; por ter desperdiçado o tempo dela e criado ilusões. E que percebia seu desespero, sua fisionomia abatida, como se ela se perguntasse o que havia de errado consigo, até fazê-la acreditar que era incapaz de semear a paixão em um homem. As palavras vão traçando caminhos por si sós, o leitor começa a se indagar de o porquê da impossibilidade desse amor se concretizar. A história desloca o foco. Pequenas passagens de fundo erótico da vida de Alexis começam a se insinuar, sempre relacionadas a outros garotos. Uma alma reprimida que luta contra os ideais de uma infância puritana.
Tudo é muito sutil, não se esqueçam da data do livro. Mas, justamente por não poder ser dito às claras, a expiação de culpa de Alexis é um exercício árduo e sinuoso de autoconhecimento: das lembranças do vestiário do colégio à fuga para o bosque na companhia de outro rapaz. É a penitência da infidelidade com a própria condição escrita em forma de carta para a mulher que abandonou.
Alexis ou o Tratado do Vão Combate é uma obra que não tem excessos; cada idéia, frase, é uma porta para reflexão. Só lembro de um livro com igual prumo: O Livro do Desassossego, de Fernando Pessoa.
A última passagem se tornou clássica. Permito-me transcrevê-la: “Peço-te humildemente, o mais humildemente possível, perdão, não por te deixar, mas por ter ficado por tanto tempo”.
Fonte:
http://www.aprancheta.com/literatura/alexis-ou-o-tratado-do-vao-combate-marguerite-yourcenar/