O senhor conhece um
conto de Villiers de L'Isle-Adam, o Suplício da Esperança? Não?
Um inquisidor
determinou que se suplicie uma de suas vítimas, como último recurso para tentar
a salvação de sua alma. Com a esperança de poder fugir da prisão, o homem
descobre que a porta do calabouço foi esquecida com a fechadura aberta,
empurra-a e sai pelos intermináveis corredores; os frades passam por ele; sem
vê-lo em algum cotovelo de muro em que procurava se ocultar; um deles, que vem
discutindo com outro sobre alto problema teológico, pousa sobre o fugitivo o
olhar distraído, e o fugitivo se imobiliza num calafrio gelado, dentro de um
desvão de parede; mas ambos distraidamente se afastam repetindo, entre outras
palavras pias, o nome de Cristo: o fugitivo já está vendo a porta de saída, lá
fora há luz e ar; se aproxima da liberdade, quando se sente abraçado pelo
próprio inquisidor, que o chama de filho e lhe diz para não fugir dali, para
não fugir de Cristo…
É assim que guardei
a recordação do conto, lido naquele tempo.
In:
"Sardanapalo", João Alphonsus. Os Melhores Contos de João Alphonsus.
Seleção de Afonso Henriques Neto. São Paulo: Global, 2001.
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