segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

A Berinjela - Eduardo Galeano #Miniconto


A Berinjela - Eduardo Galeano

Instruções para triunfar na profissão

Há mil anos, disse o sultão da Pérsia:
— Que maravilha.
Ele nunca havia provado uma berinjela, e agora comia uma cortada em rodelas temperadas com gengibre e ervas do Nilo.

Então o poeta da Corte exaltou a berinjela, que dá prazer à boca e no leito faz milagres, porque para as proezas do amor é mais poderosa que o pó de dente de tigre ou o chifre ralado de rinoceronte.

Algumas rodelas depois, o sultão disse:
— Que porcaria.

E então o poeta da Corte amaldiçoou a berinjela enganosa, que castiga a digestão, enche a cabeça de pensamentos maus e empurra os homens virtuosos ao abismo do delírio e da loucura.

— Você acaba de levar a berinjela ao Paraíso, e agora a está jogando no inferno - comentou um insidioso.

E o poeta, que era um profeta dos meios de comunicação de massa, pôs as coisas em seu devido lugar:

— Eu sou um cortesão do sultão. Não sou cortesão da berinjela.

***
Do Livro: Bocas del Tiempo, 2004

sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Review: O que Einstein disse a seu cozinheiro

O que Einstein disse a seu cozinheiro O que Einstein disse a seu cozinheiro by Robert L. Wolke
My rating: 5 of 5 stars

Livro muito interessante!!! Pela primeira vez encontrei um livro que une a ciência da química e da física nos eventos culinários, sem estar relacionado a tecnologia de alimentos. É uma obra para o leitor cozinheiro que gosta de ciência. Muito didático e com exemplos bem diários no cenário de cozinha, tanto doméstica como de restaurante e também alguns conceitos da indústria, estes são normalmente no sentido de desmistificar certas letrinha miúdas que nos passam desapercebidas nos supermercados. Enfim, um livro para ler várias vezes, de preferência, ao lado do fogão...
Só achei as receitas meio deslocadas... Em alguns casos, como dar os truques para cozer mariscos ou coisas assim, eu achei bacana, mas as outras receitas achei desnecessárias...

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quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Review: Prometeo encadenado

Prometeo encadenado Prometeo encadenado by Aeschylus
My rating: 4 of 5 stars

Sensação estranha ao terminar de ler este que é um dos pilares da nova mitologia cientificista moderna e contemporânea. Primeiro, para uma obra tão importante, se lê em menos de uma tarde; segundo, é uma tragédia onde não acontece absolutamente nada... Pode parecer ironia, mas o texto que trata da imobilidade de um acorrentado, também é um dos mais "parados" de toda a antiguidade grega. Talvez, se não tivéssemos perdido as duas outras partes que completam a trilogia, o encanto seria outro...
Mas vale a pena, se não pelas lamentações de Prometeu, ao menos pelos dois excelentes ensaios sobre o tema que abrem e fecham a obra. Especialmente o último, de Jordi Balló e Xavier Pérez, por onde desfilam um número assombroso de obras literárias e cinematográficas que estão em débito com a mitologia prometeica, tanto na literatura convencional como na ficção científica.

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quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

Literatura & Culinária. Um Teto Todo Seu. Virginia Woolf #Citação



É curioso que os romancistas nos façam acreditar que os almoços são invariavelmente memoráveis por algum dito espirituoso ou algum feito muito sábio. Mas eles mal dizem uma palavra sobre o que se comeu. Faz parte de seu costume não mencionar sopa e salmão e pato, como se a sopa e o salmão e o pato não tivessem importância, como se ninguém fumasse um charuto ou tomasse uma taça de vinho. Aqui, contudo, tomarei a liberdade de desafiar esse costume e contar a vocês que o almoço naquela ocasião iniciou-se com linguado – afundado em uma travessa –, sobre o qual o cozinheiro da universidade espalhou uma camada de um creme muito branco, a não ser pelas manchas marrons que o maculavam aqui e ali como as pintas nos flancos de uma corça. Depois disso vieram as perdizes, mas, se vocês pensaram em uma ou duas aves amarronzadas e peladas, estão enganadas. As perdizes, muitas delas, vieram com uma comitiva de molhos e saladas, os picantes e os doces, cada um a seu tempo; as batatas, finas como moedas mas não duras demais; os brotos, folhosos como botões de rosa, porém mais suculentos. Nem bem terminamos com o assado e seu séquito, e o serviçal silencioso, talvez o próprio bedel em uma aparição mais discreta, colocou diante de nós, em meio a uma guirlanda de guardanapos, um doce do qual emergiam ondas de açúcar. Chamá-lo de pudim, e assim relacioná-lo com arroz ou tapioca, seria um insulto. Nesse meio-tempo as taças de vinho jorravam amarelo e jorravam carmim; foram esvaziadas; foram completadas. E assim, aos poucos, acendeu-se no meio da espinha, a base da alma, não aquela luz elétrica rígida que denominamos inteligência, que entra e sai dos lábios, mas o brilho mais profundo, sutil e subterrâneo que é a forte chama da comunicação racional. Sem que precisássemos correr. Sem que precisássemos brilhar. Sem que precisássemos ser alguém que não nós mesmos. Todos nós vamos para o céu, e Van Dyck é quem nos guia – em outras palavras, como a vida parecia boa, como eram doces suas recompensas, como pareciam triviais esta rixa ou aquela mágoa e admiráveis a amizade e as companhias enquanto, acendendo um bom cigarro, nós nos afundávamos entre as almofadas do sofá sob a janela.


Virginia Woolf. Um Teto Todo Seu, 1929.